Conjur – A Lei 14.478/2022, marco regulatório das criptomoedas
Imagem:Pixabay
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Foi sancionado, no último dia 21 de dezembro pela Presidência da República, o Projeto de Lei 4.401/2021 [1], que institui a regulamentação de criptomoedas no Brasil.
A lei estabelece diretrizes a serem observadas na prestação de serviços de ativos virtuais e na regulamentação das prestadoras desses serviços. Além disso, altera o Código Penal e passa a prever o crime de fraude com a utilização de ativos virtuais, valores mobiliários e ativos financeiros. Por fim, modifica a Lei nº 7.492 [2], de 16 de junho de 1986, que define os crimes contra o sistema financeiro nacional, e a Lei nº 9.613 [3], de 3 de março de 1998, que dispõe sobre lavagem de dinheiro, incluindo as prestadoras de serviços de ativos virtuais no rol de suas disposições.
O Marco Legal tem como objetivo regular o mercado de “criptoativos” no país e traça conceitos basilares, definindo como ativo virtual toda “a representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos e utilizada para realização de pagamentos ou com propósito de investimento”.
Excluem-se da conceituação de ativo digital a moeda nacional e estrangeira, a moeda eletrônica, instrumentos que provejam ao titular acesso a produtos ou serviços especificados ou o benefício proveniente desses produtos ou serviços, a exemplo de pontos de recompensa de programas de fidelidade e representações de ativos cuja emissão, escrituração, negociação ou liquidação estejam previstas em lei ou regulamento, consoante disposto no dispositivo 3º, caput e incisos I a IV da norma legal.
Os ativos virtuais abrangidos pela lei, conhecidos como “tokens”, são restritos aos “tokens de pagamento”, utilizados como forma de pagamento para fazer aquisições de produtos e serviços. O inciso II do art. 3º exclui da incidência da norma legal os “tokens de utilidade” e que representam o acesso a um produto ou serviço, como benefícios ou créditos em formato digital.
Não estão abrangidos pelo marco regulatório os denominados Tokens Não Fungíveis – NFTs, definidos como símbolos eletrônicos que representam um item exclusivo, digital ou físico, único e insubstituível devido a suas características singulares. Para fins ilustrativos e com objetivo de facilitar a compreensão, são exemplos de ativos virtuais que utilizam a aplicação dessa tecnologia: as músicas, memes, obras de arte, imóveis virtuais, projetos de designers, jogos online, postagens em redes sociais, entre outros.
Apenas relembrando, o “tweet” feito por Jack Dorsey, ex-CEO do Twitter, em março de 2006, foi leiloado como um NFT em março de 2021, por US$ 2,9 milhões [4].
Também não se vinculam à incidência da normativa legal os ” security tokens”, ativos virtuais negociáveis como obrigações, débitos, debêntures, ações, garantias e até imóveis, cujo o procedimento é feito através de uma tecnologia “blockchain” e com o uso de um token criptográfico. A não abrangência da lei aos ” security token” se justifica pela classificação destes como valor imobiliário e, portanto, sujeitos à regulação da CVM.
A lei estabelece as diretrizes para a prestação dos serviços virtuais, segundo parâmetros que serão elaborados pelo órgão regulador, a ser definido pelo Poder Executivo. Os critérios que o futuro órgão observará levarão em conta a livre iniciativa e livre concorrência, boas práticas de governança, transparência nas operações, segurança da informação e proteção de dados pessoais, proteção e defesa dos consumidores e usuários e a poupança popular, solidez e eficiência das operações e, por fim, prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento ao terrorismo.
Em relação ao órgão que fará a regulação do mercado de criptomoedas, a expectativa é de que as atribuições sejam desempenhadas pelo Banco Central do Brasil (BCB), levando-se em conta as funções que exerce perante a economia nacional e a responsabilidade por autorizar as instituições que buscam integrar o Sistema Financeiro Nacional (SFN).
Ponto relevante é a conceituação da figura da “prestadora de serviços de ativos virtuais” como sendo a pessoa jurídica que executa em nome de terceiro pelo menos um dos serviços de ativos virtuais elencados nos incisos I a V do art. 5º da lei. O parágrafo único do referido dispositivo legal prevê a necessidade de autorização do futuro órgão responsável pela regulamentação para que as prestadoras de serviços realizem outros serviços que estejam relacionados direta ou indiretamente à sua atividade.
Positivo o condicionamento de novos serviços à autorização do órgão regulador, sem, no entanto, inviabilizar a inovação de serviços.
O Código Penal é alterado pelo art. 10 da norma legal, passando o art. 171 a prever um novo tipo de fraude em prestação de serviços virtuais, valores mobiliários ou ativos financeiros, sujeito a pena de reclusão de quatro a oito anos e multa.
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O Marco Regulatório das criptomoedas no Brasil vem em um momento de extrema importância, pois determina regras quanto às responsabilidades das agências prestadoras de serviços virtuais e do futuro órgão regulador.
Recentemente, testemunhamos o escândalo envolvendo a falência da corretora de criptomoedas FTX e de seu co-fundador Gary Wang, o que impactou negativamente o mercado de criptomoedas. [5]
A FTX, cujo fundador é Sam Bankman-Fried, era considerada até pouco tempo uma das plataformas de maior confiabilidade mundial. Entretanto, faliu após a constatação do cenário de instabilidade financeira. A ausência de uma resposta legal regulatória reacende o debate sobre a importância de regras claras e robustas que sejam efetivas para lidar com situações como esta.
Nesse sentido, muito bem-vinda a Lei nº 14.478/2022 [6], uma vez que a regulação tem potencial de aumentar a confiança dos investidores fomentando, ainda mais o mercado, através de regras que garantam maior segurança e transparência aos investidores e prevenindo atividades ilegais. Todos nós ganhamos!
Martha Leal, Mestre em Direito e Negócios Internacionais, Pós-graduanda em Direito Digital, Data Protection Officer ECPB pela Maastricht University. Advogada especialista em Proteção de Dados, Pós-graduada em Direito Digital e Presidente da Comissão de Comunicação Institucional do Instituto Nacional de Proteção de Dados (INPD)
Notas
[1] Ver em: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/151264
[2] Ver em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7492.htm
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[3] Ver em : https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9613.htm
[4] Disponível em: https://mundoconectado.com.br/noticias/v/24670/nft-do-primeiro-tweet-comprado-por-us-29-milhoes-vale-um-pouco-mais-de-us-6-mil-hoje
[5] Disponível em: https://www.poder360.com.br/internacional/associados-do-fundador-da-ftx-se-declaram-culpados-por-fraude/
[6] Ver em : http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2022/lei/L14478.htm